Thursday, June 08, 2006

METAMORFOSES DA DOR


Ideia: O trabalho retoma O CALDEIRÃO em que o acrílico é utilizado como transparência e as formas são compostas por cores que se alongam e rematam umas às outras, sob o signo da adaptabilidade e flexibilidade. Registar degenerescências do corpo e da mente e a forma como estes reagem à dor.

Alvísceras
Tive de ir ao hospital buscar as suas roupas. Meti-me no carro e fui. Perguntei onde se iam buscar as roupas das pessoas mortas. Cheguei e disse ao que vinha; deram-me um saco de plástico, transparente, grande, com roupas dentro. Não o queria abrir mas eles abriram-no e começaram a tirar tudo para fora porque eu tinha de confirmar se não faltava nada. Eu não podia saber se faltava ou não e não queria saber. Foram tirando peças de roupa, uma carteira, um relógio, uma aliança, um par de sapatos. Mostraram-me uma camisa e uma camisola rasgadas de alto a baixo.
Vi pessoas debruçadas sobre ele a rasgarem-lhe a roupa numa tentativa de o salvarem. A pressa do desfibrilhador, a aplicação dos eléctrodos, o primeiro choque, sem resposta, o segundo, sem resposta, o terceiro, a resposta. O segundo silêncio, a segunda tentativa, a continuação do silêncio. A chegada da ambulância ao hospital ainda sem resposta, a terceira tentativa porque, talvez....a desistência. O silêncio dele e dos outros, o voltar costas.
Levo a minha roupa rasgada para o carro. Paro no primeiro caixote de lixo que encontro e deito fora a roupa toda. Não faltava nada mas porque lhe rasgaram a roupa? Foi a pressa de o salvar... Mas ele morreu, não morreu?


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